Medo da felicidade (Dia 1)

Dia 1

Estava uma noite inquieta. A cidade estava toda iluminada e havia uma mistura de cheiros intensa no ar.
Passei pelo café do costume, mas não te vi. Apenas um amontoado de pessoas e o Jim ao balcão.
Pus a chave na fechadura, mas a porta não queria abrir. Assim que entrei em casa, posei a mala e os sacos das compras e fui apontar no calendário que tenho afixado no frigorífico que, tenho de mandar arranjar a fechadura rapidamente.
Abri uma garrafa de vinho, enchi o copo e fui em direção ao sofá, enquanto ía largando os sapatos. Sentei-me e bebi. Olhei pela janela e a lua estava enorme. Que dia!
No ano passado, por esta altura estava a fechar os maiores e melhores negócios para a empresa e este ano, sou chamada ao escritório da diretora, com um ultimato. Tenho 15 dias para fechar um negócio significativo ou o meu lugar fica disponível.
Tocam à campainha. É o jantar. Domino’s pizza e a dieta vai pela pia abaixo.
Amanhã tenho de ir ao ginásio. Já lá vai uma semana de procrastinação.
Mando mensagem à minha irmã que mora a 2 quarteirões daqui: “Tenho pizza e vinho para o jantar. Apareces?”
Passados 2 minutos recebo resposta: “Tenho cá o Michael. Não vai dar.”
A minha irmã tem uma relação aberta com o Michael.  Daquelas que ambos podem estar com  outras pessoas, mas acho que ela se está a apaixonar e mais tarde ou mais cedo, esta situação não vai resultar.
Respondo-lhe: “Ok! Cuidado com esse coração.” e logo de seguida recebo outra mensagem: “
😊 Não sejas como a mãe.”
Diz-me sempre isto, mas não sei ser de outra forma. É uma das pessoas que mais amo no Mundo. Minha amiga e confidente. Não quero que se magoe nunca! Se isso faz-me igual à mãe, tudo bem. Não tem mal.
E pronto, tenho-te a vaguear no pensamento novamente.
Será que devo enviar-te mensagem?
Esta pizza é gigante só para mim. Aliás, este apartamento também o é.
Talvez devesse arranjar um animal de estimação ou talvez dizer-te o que sinto.
O segredo mais bem guardado de Nova Iorque. Não é que existam muitos. Acho que nunca conheci uma cidade tão transparente. What you see it’s you get!
Pessoas a correrem de um lado para o outro. Business, business, business. Chega a ser uma loucura, todos os dias. Fico cansada só de assistir à pressa dos outros.
Steve, onde andas tu, para além de viveres no meu pensamento?
Dou uma dentada na pizza. Wow, estava mesmo a precisar disto. Acendo a TV, para ver as notícias. O normal. Mortos, politiquices, desporto e pouco mais.
Anatomia de Grey ou Narcos? Não me apetece ver nenhuma delas. Apago a TV.
Fico só eu e a Lua, enorme e brilhante... E tu!
A culpa é do Jim. Sempre a tentar arranjar-me o par perfeito, mas desta vez, apesar de não querer admitir, talvez tenha acertado.
Em 3 meses, aconteceu um beijo há uma semana e não soube lidar com isso. Como é hábito fugi a sete pés e até hoje consegui a proeza de não responder a cerca de 40 mensagens. Que estúpida e burra que me sinto. Parece que paralisei. Na verdade, acho que foi o cérebro que paralisou com tanta burrice.
Deves odiar-me por não te ter dito nada. Não deves sequer querer ver-me. Sempre que olho para as fotos do aniversário do Jim, percebo o quão feliz estava e muito, graças a ti. Nessa noite, tive o Jim constantemente a dizer-me que ele é que sabia o que era melhor para mim. Quem era melhor para mim…
Tenho evitado ir ao café depois do trabalho. Já sei que vou ser massacrada e no fundo sei que com razão. Também tenho receio de me esbarrar contigo. Assim, passo na rua, espreito de soslaio e venho para casa.
Nada parece correr bem. Sinto-me a perder o controlo. Primeiro contigo, depois no trabalho e não sei o que mais virá por aí.
Meu Deus, já começo a parecer-me com as pessoas que critico. Sempre a reclamarem da Vida e a chorarem pelos cantos.
Vou até à casa de banho e ponho a água a correr para encher a banheira. Despejo uns sais de banho e voilà, está pronto. Mergulho por um minuto, como se fosse um baptismo.
Ao som de “Fallingforyou” dos The 1975, bebo um pouco de vinho e acabo por desabar num choro, silencioso e sentido.


(continua)

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