A nossa história e um jantar de família! (história completa)

Já amanheceu!
Saltei da cama, vesti o robe e abri as cortinas escarlate, que impediam a luz de entrar.
Recebi, imediatamente, o gemido reprovador, do Gonçalo.
Todos os dias, era a mesma coisa. Nunca punha o despertador e tinha de ser eu a acordá-lo. Acho que se habituou aos mimos, logo de manhã.
Que criatura tão carente! (pensei eu, enquanto lhe dei um beijo na orelha).
Ele detesta beijos na orelha, no entanto era a forma mais rápida de se levantar, porque vinha logo, meter-se comigo e dizer-me, como sou má, ao acordá-lo daquela forma.
As manhãs começavam sempre em galhofa. O seu sentido de humor é contagiante.
Tenho dias em que acordo, cansada e rabugenta, com uma neura impossível, mas o Go, deixa-me bem-disposta.
Hoje é o dia dele fazer o pequeno-almoço. Inventa mil e uma coisas. Nada do que faz vem nos livros de culinária, mas na verdade, saem grandes obras primas.
Normalmente, está na cozinha a fazer as misturas e a rir-se, como se estivesse a contar uma anedota. É um criançola impressionante.
Moramos juntos há três anos e namoramos há cinco. Sinto que o conheço, desde sempre.
Os nossos amigos chamam-nos o “par maravilha”. Somos sempre os últimos a chegar a todo o lado. Ligam-nos sempre, muito irritados, para saberem, onde andamos e se estamos demorados, mas depois acabam por se esquecer dos atrasos e as noites terminam com um “voltem sempre, por favor!”.
Nunca lhes dizemos, porque nos atrasamos, o que os deixa extremamente irritados.
É segredo!
Hoje temos um jantar, em casa dos pais do Go.
Sinceramente, preferia não ir. Vão lá estar uns primos e uns tios, que não conheço.
A família dele, é muito tradicional e preconceituosa. Faço sempre, um esforço enorme, para não me sairem disparadas, palavras da minha boca, de que me possa arrepender mais tarde. O mais certo seria não me arrepender, pelo menos, não por as dizer, mas sim, porque iria criar conflitos, que poderiam magoar o Go. Ambos, acordámos, que jamais nos iríamos aborrecer, por causa da família, de um ou de outro, mas nem sempre é fácil.
Vamos sair de casa e vamos dar uma volta, até à praia. O nosso passeio nas manhãs de fim-de-semana, que nos ajuda a relaxar. Muitas das vezes, ficamos apenas sentados, a conversar e a ver e ouvir o mar. Se estiver muito frio, paramos o carro em frente à praia, pomos o Wicked Game do Chris Isaak a tocar e deixamo-nos ficar.
Desta vez, decidi fazer-lhe uma surpresa. Coloquei na minha mala, duas taças e uma garrafa de champanhe. Ao chegarmos à praia, a mais bela praia de todas, com grandes rochedos, que nascem da areia e irrompem no mar, descemos cerca de 70 escadas, até sentirmos a areia nos pés. Uma areia macia, quase branca. Um manto aveludado, que parecia abraçar os nossos pés, numa carícia imensa.
Está um tempo bestial! O céu está limpo, de um azul profundo e o sol, dá-nos o calor necessário, para a nossa manhã ser agradável.
Sentámo-nos na areia, com o olhar focado no mar e o Go, começou a falar no jantar.
Parece que afinal, houve mudança de planos e o jantar vai ser na casa dos pais, perto de Peniche.
Pedi-lhe para não falar nisso agora e para tapar os olhos com as mãos.
Sorriu e disse-me que de certeza tinha preparado, alguma das minhas.
Tirei da mala a surpresa, sem nunca tirar os olhos das mãos dele, porque se o conheço bem, estava à espreita, por entre os dedos, à espera de uma pequena distracção da minha parte.
“SURPRESA!!!”
Abri o champanhe... agarrou-me e deu-me um beijo, escusado será dizer, que deixei entornar um pouco daquele nectar dos deuses, no meio daquele êxtase.
Perguntou-me o que comemorávamos e apenas disse-lhe, que o facto de estarmos juntos, era motivo suficiente.
“Não existes!” - disse-me enquanto saboreava o doce do champanhe.
“Pois não! Eu não passo de uma ilusão, criada pela tua mente brilhante!” - respondi, em tom de gozo.
Bebemos a garrafa até ao fim e fomos até à beira mar, molhar os pés. A água está gelada. Fiquei completamente arrepiada e o Go ainda goza com a situação.
Está muito mal-educado e a culpa é minha.
Despiu o casaco e veio colocá-lo, sobre os meus ombros. Realmente, já me sinto mais quente.
A manhã já está a chegar ao fim e vamos embora para casa. Como foi ele que fez o pequeno-almoço, agora vou eu tratar do almoço. Temos também de arranjar as coisas, para irmos para Peniche, para o jantar da família coquete, que jamais pega em croquetes.
Enfim... sacrifícios! O amor tem cada coisa!?
No caminho para casa, parámos para pôr gasolina, para não termos de empurrar o carro, até Peniche.
Chegámos a casa e vou preparar o almoço. Vai ter de ser alguma coisa rápida, porque temos de nos apressar para irmos embora.
Enquanto preparo o almoço o Go, põe a mesa e que mesa! Não vale a pena dizer que é rápido, que ele adora inventar.
Almoçámos e preparámos as coisas para a viagem.
Estamos agora a caminho de Peniche.
Estou cansada, acho que vou aproveitar para dormir um pouco. Não gosto de dormir, quando vou em viagem, porque deixo o Go na prática, sem companhia, mas o trabalho tem sido cansativo e os jantares de família, prolongam-se sempre.
Senti um toque... um ligeiro e suave empurrão. Falam-me ao ouvido... sussurram! É o Gonçalo, a avisar-me que já chegámos.
É a primeira vez, que venho a casa deles, aqui perto de Peniche. Fica um pouco isolada.
Tem um pequeno pátio na entrada, para estacionar os carros e a casa, parece-me ser grande.
A construção é antiga, no entanto, nota-se que é cuidada. Tem uma garagem, nas traseiras, mas pelo que o Go disse, serve para arrumações.
Ao entrarmos, temos um hall e várias portas, que dão para as divisões.
Nas paredes, estão quadros pintados a óleo. Foi o pai que os pintou, no tempo da universidade. Da cozinha, vem um cheiro delicioso, a bolo. A Sra. Ludmila (mãe do meu querido), por incrivel que pareça, está na cozinha, a cozinhar.
Isto é mesmo um achado! Perguntei ao Gonçalo, se tinha trazido a máquina fotográfica, porque este era sem dúvida um momento Kodak, para mais tarde recordar, mas infelizmente, disse-me que não, foi então que me lembrei do meu telemóvel.
Graças às novas tecnologias, tirei aquela que seria a foto do ano “ Sra. D. Ludmila da Fonseca e Silva, a cozinheira chefe da mansão no fim do mundo”. Hilariante!
A minha querida sogrinha, prontamente, torceu o nariz ao meu gesto infantil, como ela o caracterizou. Ela adora-me... a malvada que lhe tirou o filho, a ladra de filhos dos outros!
Enfim, não se pode agradar a gregos e a troianos e eu prefiro agradar ao filho dela. Desculpe-me Lu, mas é a verdade!
O pai dele, é um querido, sempre foi muito simpático comigo e temos longas conversas.
Faz-me lembrar o meu pai, que sempre me ensinou, tudo aquilo que os meus professores não conseguiram.
É incrível, como sempre consegue esclarecer-me, sobre qualquer assunto. Uma verdadeira enciclopédia!
Provei o bolo, que a Lu fez... bolo de chocolate, o favorito do Go, claro!
Vamos agora espreitar a sala de estar, enquanto preparam o jantar.
O Go aproveita para me fazer uma visita guiada pela casa e mostrar tudo ao pormenor.
A casa é fantástica, transmite uma energia poderosa, quase mística.
Chegámos ao quartodele, onde sempre ficou, nos fins-de-semana e férias, em que vinha para cá.
Tem uma janela, que dá acesso a uma varanda, que tem uma vista para o jardim.
O Go puxa-me pelo braço, coloca-me junto a ele e diz-me que chegou a hora, de me fazer uma pequena surpresa.
Habilmente, fecha com uma mão as cortinas enquanto, com a outra me agarra firmemente.
Bem... o resto, não preciso de vos contar. Usem a imaginação!
Posso dizer que a pequena surpresa, não era assim tão pequena.
Quando saímos do quarto, já tinhamos a família toda à nossa procura...
Os pais do Go e os tios e primos, que tinham chegado entretanto.
Fizeram-se as respectivas apresentações e dirigimo-nos todos para a sala de jantar.
O jantar está na mesa. A Lu preparou, um prato de peixe, com um molho especial e deu-lhe um nome francês, porque é chique e fica sempre bem.
As conversas faziam-se aos pares, um pouco obtusas e enviesadas.
Alguns risos e muitos sorrisos amarelos.
No final do jantar o Go levantou-se e disse que fazia questão, de ir buscar a sobremesa.
Ofereci-me para ir ajudar, mas ele prontamente, me disse para ficar sentada, porque eu era uma convidada.
A mãe dele sorriu e levantou-se, para o ajudar.
Fiquei a conversar com o Sr. Gustavo (o pai do Gonçalo), sempre cordial e simpático.
Um dos primos, também aproveitou para me fazer um interrogatório de família.
Passaram alguns minutos e a Lu e o Go, voltaram sorridentes da cozinha, com as sobremesas.
Ele trouxe a minha sobremesa, com direito a cereja no topo.
Foram distribuídas as mousses de manga, pelos convidados e ao atacar a minha mousse, com uma colher do século XVIII, verifiquei que existia algo de errado.
Fez-se silêncio! Todos me olhavam.
Levei a colher à taça, mas a colher estava a tocar em alguma coisa, que não o fundo da taça.
Tentei apanhar o que quer que fosse, que estivesse, na minha mousse e quando levantei a colher, vinha uma pequena caixinha bordeaux, embrulhada em papel aderente.
Riram-se na sala, mas eu fiquei espantada e sem reacção, como quem não percebe o que se está a passar.
O que fazia aquela caixinha na minha sobremesa?
Não acredito!!! Caem-me lágrimas... lágrimas de alegria e de emoção...
SIM, aceito!
Ele pediu-me em casamento e eu aceitei.
Num instante, estava do outro lado da mesa e agora já está junto a mim.
Foi sem dúvida a melhor e a maior surpresa, que me fizeram até hoje.
O Go disse-me que já todos sabiam, que ele ía fazer o pedido e que era mesmo esse o propósito do jantar. Esta revelação deixou-me curiosa, apenas em relação à Sra. Ludmila da Fonseca e Silva.
É também, muito bom saber, que ele ainda me consegue surpreender desta forma e que a nossa chama ainda arde, como no início.
Foi um dia muito especial para mim. Por isso mesmo, decidi que merecia um digno registo.
Fica então o registo, no meu “black book”, deste dia que marca definitivamente, o fim da minha adolescência e o início da minha vida de adulta e como noiva de Gonçalo da Fonseca e Silva, o meu grande amor!
É verdade! Não cheguei a apresentar-me... o meu nome é Mariana Albuquerque e este é o meu diário (black book).

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