Boca do Inferno

O telefone tocou umas quantas vezes... deixei-o tocar... aproveitei para ouvir o meu toque, o “Little Sister” dos Queens of the Stone Age, enquanto respirava fundo, para falar calmamente com o Helder ao telefone, até que atendi... meio azeda e distante, entre um “Então tudo bem?” e uma conversa monossilábica, que pouco passou de “Sim” e “Não”, combinámos um encontro para mais tarde.
Hoje é o meu aniversário e ele não teve a decência de me ligar a dar os parabéns.
Esperei... no local combinado... esperei. Fumei um cigarro... e outro e outro, mas ele nessa noite não apareceu.
Estava eu, numa noite de lua cheia, completamente sozinha na Boca do Inferno.
Corria uma arajem bem fresca, que vinha do mar.
Só se ouvia o som das ondas a baterem nas rochas, com uma violência brutal.
Lembro-me que estava escuro, só se conseguiam ver os vultos das rochas esculpidas, que mais pareciam pessoas e uma cruz, no meio do nada.
Foi neste ambiente sinistro, que o Helder, me deixou à espera, sozinha.
Esfreguei as mãos nos braços, numa tentativa de me aquecer, enquanto digeria, a tremenda falta de respeito, do meu querido.
Só me apetecia gritar, mas o local não me parecia propício. Fiquei quieta. Encostei-me ao muro e fiquei a olhar o reflexo da Lua no mar.
Pouco tempo depois, comecei a ouvir passos, mas estava tão escuro, que não conseguia ver nada. Olhei para todos os lados e cada vez ouvia mais e comecei a ver vultos.
Eu tremia de frio e de medo. Estava completamente aterrorizada e sem saber o que fazer.
Comecei a ver um grupo de pessoas com umas capas com capuzes pretas, a virem em direcção ao miradouro. Achei muito estranho e resolvi descer as escadas, apressadamente e ir mais para a frente, como estava mais escuro podia ser que não dessem por mim.
Sentei-me bem enroscada, tentado ficar o mais invisível possível. A minha respiração acelerada, estava completamente descontrolada. Tive de conter a respiração, durante alguns segundos, para que não me denunciasse.
Senti tocarem-me no ombro...o pânico foi tanto, que desmaiei.
Quando acordei, tinha o Helder, completamente pálido a perguntar-me se estava bem.
Pus as mãos na cabeça... ainda estava um pouco zonza do desmaio e quando olhei em volta, vi as pessoas das capas pretas, todas a olharem para mim.
Apertei com força as mãos do Helder, até que percebi que essas pessoas eram meus amigos e me lembrei que pouco antes de desmaiar, todos disseram em coro:
-“SURPRESA!”
- Raquel, é a tua festa surpresa. Eu e os teus amigos quisemos fazer alguma coisa diferente. Não tinhamos intenção de te deixar nesse estado. - disse o Helder, em tom de arrependimento.
- Muitos Parabéns, minha querida! - acrescentou.
Esqueci-me do susto e rendi-me à surpresa, que afinal foi tão bem preparada, que me fez sentir com tanto medo, que não julguei possível.
Sentámo-nos no miradouro a conversar, a comer o bolo de aniversário e a beber o champanhe.
Rimo-nos da situação, até que...
Começámos a ouvir passos... vinham de todas as direcções.
Olhei em todas as direcções...
Senti tocarem-me no ombro...o pânico foi tanto, que desmaiei.
(The End)



Na Boca do Inferno... só mesmo com a minha Criatura do Mal :)

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